Sobre as músicas do blog... Não devem ser consideradas simples "fundos musicais" para os textos... Foram escolhidas com carinho e apreço, dentre o que há de melhor... São verdadeiras jóias que superam em muito os textos deste humilde escrevinhador... Assim, ao terminar de ler certo texto, se houver música na postagem, termine de ouví-la, retorne, ouça-a novamente se toda atenção foi antes dedicada ao texto... "interromper uma bela música é como interromper uma boa foda... Isso não se faz!..." Por último, se você conhece uma música que, na sua opinião, combina melhor com o texto, não deixe de enviar sua sugestão...

Outros Escritores


Textos desta página (o último foi postado mais recentemente e é o primeiro da lista - um caso típico onde "os últimos serão os primeiros"):

  1. Outro tipo de mulher nua (Texto atribuído à Martha Medeiro
  2. O cravo não brigou com a rosa (Texto de Luiz Antônio Simas)
  3. Deus e o diabo (Texto de Machado de Assis)
  4. Vou-me Embora pra Pasárgada


RESERVO A IMAGEM DESTE TEXTO PARA POSTAR AO FINAL.
ALI SERÁ MELHOR COMPREENDIDA E EXPLICADA.
VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA
                                                                          Manuel Bandeira

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

Texto extraído do livro "Bandeira a Vida Inteira",
Editora Alumbramento – Rio de Janeiro, 1986, pág. 90

Les Demoiselles d'Avignon - Pablo Picasso (Cubismo) - Óleo sobre Tela
Pablo Picasso retrata prostitutas em um bordel de Barcelona em LesDemoiselles d'Avignon. No entanto, o que mais chocou os críticos não foi o tema da tela, mas a forma como foi pintada. A modernidade da obra resulta de uma série de estratégias artísticas audaciosas.  Les Demoiselles d'Avignon exala uma sensualidade oculta nas pinceladas enérgicas de Pablo Picasso.




      OUTRO TIPO DE MULHER NUA*
      * Texto atribuído à Martha Medeiros.



      Depois da invenção do photoshop,
      até a mais insignificante das criaturas
      vira uma deusa,
      basta uns retoquezinhos,
      aqui  e ali.
      Nunca vi tanta mulher nua.

      Os sites da internet renovam semanalmente
      seu estoque de gatas vertiginosas.
      O que não falta é candidata
      para tirar a roupa.
      Dá uma grana boa.

      E o namorado apóia,
      o pai fica orgulhoso,
      a mãe acha um acontecimento,
      as amigas invejam,
      então pudor pra quê?

      Não sei se os homens estão radiantes
      com esta multiplicação de peitos e bundas.
      Infelizes não devem estar,
      mas duvido que algo que se tornou tão banal
      ainda enfeitice os que têm mais de 14 anos.

      Talvez a verdadeira excitação esteja, hoje,
      em ver uma mulher se despir de verdade...
      emocionalmente.

      Nudez pode ter um significado diferente
      e muito mais intenso.
      É assistir a uma mulher  desabotoar suas fantasias,
      suas dores,
      sua história.

      É erótico ver uma mulher que sorri,
      que chora,
      que vacila,
      que fica linda sendo sincera,
      que fica uma delícia sendo divertida,
      que deixa qualquer um maluco sendo inteligente.


      Uma mulher que diz o que pensa,
      o que sente e o que pretende,
      sem meias-verdades,
      sem esconder seus pequenos defeitos,
      tampouco os grandes.

      Aliás,
      deveríamos nos orgulhar de nossas falhas,
      é o que nos torna humanas,
      e não bonecas de porcelana.

      Arrebatador é assistir
      ao desnudamento de uma mulher
      em quem sempre se poderá confiar,
      mesmo que vire ex,
      mesmo que saiba demais.

      Pouco tempo atrás, posar nua
      ainda era uma excentricidade das artistas,
      lembro que esperava-se com ansiedade
      a revista que traria um ensaio de Dina Sfat,
      por exemplo — pra citar uma mulher
      que sempre teve mais o que mostrar
      além do próprio corpo.

      Mas agora não há mais charme nem suspense,
      estamos na era das mulheres coisificadas,
      que posam nuas porque consideram
      um degrau na carreira.
      Até é.
      Na maioria das vezes, rumo à  decadência.
      Escadas servem para descer também.

      Não é fácil tirar a roupa e
      ficar pendurada numa banca de jornal,
      mas, difícil por difícil,
      também é complicado abrir mão
      de pudores verbais,
      expor nossos segredos e insanidades,
      revelar nosso interior

      Mas é o que devemos continuar fazendo.
      Despir nossa alma
      e mostrar pra valer quem somos,
      o que trazemos por dentro.
      Não conheço strip-tease mais sedutor.


      . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .


      O CRAVO NÃO BRIGOU COM A ROSA* 

      *Texto de Luiz Antônio Simas






                                  Chegamos ao limite da insanidade da onda do politicamente correto.


      Soube dia desses que as crianças, nas creches e escolas, não cantam mais "O cravo brigou com a rosa".


      A explicação da professora do filho de um camarada foi comovente: a briga entre o cravo - o homem - e a rosa – a mulher - estimula a violência entre os casais. Na nova letra "o cravo encontrou a rosa debaixo de uma sacada/o cravo ficou feliz /e a rosa ficou encantada".


      Que diabos é isso? O próximo passo é enquadrar o cravo na Lei Maria da Penha...


      Será que esses doidos sabem que "O cravo brigou com a rosa" faz parte de uma suíte de 16 peças que Villa Lobos criou a partir de temas recolhidos no folclore brasileiro?


      É Villa Lobos, cacete!


      Outra música infantil que mudou de letra foi "Samba Lelê". Na versão da minha infância o negócio era o seguinte: Samba Lelê tá doente/ Tá com a cabeça quebrada/ Samba Lelê precisava/ É de umas boas palmadas.


      A palmada na bunda está proibida. Incita a violência contra a menina Lelê.


      A tia do maternal agora ensina assim: Samba Lelê tá doente/ Com uma febre malvada/Assim que a febre passar/ A Lelê vai estudar.


      Se eu fosse a Lelê, com uma versão dessas, torcia pra febre não passar nunca.


      Os amigos sabem de quem é Samba Lelê?


      Villa Lobos!... De novo!


      Podiam até registrar a parceria. Ficaria assim: Samba Lelê, de Heitor Villa Lobos e Tia Nilda do Jardim Escola Criança Feliz.


      Comunico também que não se pode mais atirar o pau no gato, já que a música desperta nas crianças o desejo de maltratar os bichinhos.


      Quem entra na roda dança, nos dias atuais, não pode mais ter sete namorados para se casar com um. Sete namorados é coisa de menina fácil.


      Ninguém mais é pobre ou rico de marré-de-si, para não despertar na garotada o sentido da desigualdade social entre os homens.


      Dia desses alguém [não me lembro exatamente quem] se saiu com essa e não procurei a referência no meu babalorixá virtual. Pai Google da Aruanda foi espinafrado porque disse que ecologia era, nos anos setenta, coisa de viado.


      Qual é o problema da frase? Ecologia, de fato, era vista como coisa de viado.


      Eu imagino se meu avô, com a alma de cangaceiro que possuía, soubesse, em mil novecentos e setenta e poucos, que algum filho estava militando na causa da preservação do mico leão dourado, em defesa das bromélias ou coisa que o valha.


      — Bicha louca. — Diria o velho.


      Vivemos tempos de não me toques que eu magôo.


      Quer dizer que ninguém mais pode usar a expressão coisa de viado ?


      Que me desculpem os paladinos da cartilha da correção, mas isso é uma tremenda babaquice. O politicamente correto é a sepultura do bom humor, da criatividade, da boa sacanagem.


      A expressão coisa de viado não é, nem a pau (sem duplo sentido), ofensa a bicha alguma.


      Daqui a pouco só chamaremos o anão - o popular pintor de roda-pé ou leão de chácara de baile infantil - de deficiente vertical .


      O crioulo – vulgo picolé de asfalto ou bola sete (depende do peso) - só pode ser chamado de afrodescendente.

      O branquelo - famoso branco azedo ou Omo total - é um cidadão caucasiano desprovido de pigmentação mais evidente.


      A mulher feia - aquela que nasceu pelo avesso, a soldado do quinto batalhão de artilharia pesada, também conhecida como o rascunho do mapa do inferno - é apenas a dona de um padrão divergente dos preceitos estéticos da contemporaneidade.


      O gordo - outrora conhecido como rolha de poço, chupeta do Vesúvio, Orca, baleia assassina e bujão - é o cidadão que está fora do peso ideal.
      O magricela não pode ser chamado de morto de fome, pau de virar tripa e Olívia Palito. O careca não é mais o aeroporto de mosquito, tobogã de piolho e pouca telha.


      Nas aulas sobre o barroco mineiro, não poderei mais citar o Aleijadinho. Direi o seguinte: o escultor Antônio Francisco Lisboa tinha necessidades especiais...


      Não dá! O politicamente correto também gera a morte do apelido, essa tradição fabulosa do Brasil.


      O recente Estatuto do Torcedor quer, com os olhos gordos na Copa em 2014, disciplinar as manifestações das torcidas de futebol. Ao invés de mandar o juiz pra putaqueopariu e o centroavante pereba tomar no olho do cu, cantaremos nas arquibancadas o allegro da Nona Sinfonia de Beethoven, entremeado pelo coro de Jesus, alegria dos homens, do velho Bach.


      Falei em velho Bach e me lembrei de outra. A velhice não existe mais...


      O sujeito cheio de pelancas, doente, acabado, o famoso pé na cova, aquele que dobrou o Cabo da Boa Esperança, o cliente do seguro funeral, o popular tá mais pra lá do que pra cá, já tem motivos para sorrir à beira da sepultura.


      A velhice agora é simplesmente a "melhor idade"  (Ihhh... tão falando de mim...).


      Se Deus quiser morreremos todos gozando da mais perfeita saúde.


      Defuntos?


      Não!

      Seremos todos inquilinos do condomínio Cidade do Pé Junto.

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      *Luiz Antônio Simas

      Mestre em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro professor de História do ensino médio.

       

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      Deus e o diabo

      "Deus, para a felicidade do homem, inventou a fé e o amor. O Diabo, invejoso, fez o homem confundir fé com religião e amor com casamento".
      Machado de Assis





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