Sobre as músicas do blog... Não devem ser consideradas simples "fundos musicais" para os textos... Foram escolhidas com carinho e apreço, dentre o que há de melhor... São verdadeiras jóias que superam em muito os textos deste humilde escrevinhador... Assim, ao terminar de ler certo texto, se houver música na postagem, termine de ouví-la, retorne, ouça-a novamente se toda atenção foi antes dedicada ao texto... "interromper uma bela música é como interromper uma boa foda... Isso não se faz!..." Por último, se você conhece uma música que, na sua opinião, combina melhor com o texto, não deixe de enviar sua sugestão...

Meu leito

Música deste post (é bem melhor com música):"Solitude", de Duke Ellington, interpretação de Ralph Sharon.





"Aufstieg" 2001 - Aquarela - Robert Schrag




Meu leito...

Meu leito...
    Nele nu adentro
    contigo em pensamento...
    Em prestidigitação materializas-te
    e aconchegas-te ao meu corpo...
    Sinto teu calor, teu cheiro.
    Entranho meus dedos em teus cabelos.
    Coloco minha mão em teu sexo...
    Sinto-o úmido, vivaz,
    mas comigo tu não estás.

Meu leito
    Nele nu me deito.
    Só, sem alento.
    Mas numa espécie de fetiche
    sinto teu corpo sobre o meu...
    Teu cavalgar...
    Como ondas do mar.
    Busco te agarrar...
    Só encontro o ar!

Meu leito
    Vê minha nudez com respeito
    Não tem, no entanto, despeito...
    Mesmo um leito frio
    não quer sentir o vazio
    que carrego no velho peito...
    Solidão que não tem jeito...
    Opção de uma vida...
    Resultado de grande ferida
    Que sangra em cada gesto,
    em cada verso que me ponho a escrever,
    cada vez mais a te perder...

Meu leito...
    Me vê nu...
    Todos me vêem nu.

Fora da realidade...




Fora da realidade...



A vida não é poesia... Nem se deve buscar transformá-la em tal. Imagine se a vida virasse poesia, para ser vivida NOITE E DIA... A poesia se vulgarizaria...

E seria de infinita tristeza que todos os sonhos acabassem na pobreza de poderem ser vividos, de fato sentidos, relatados... Deixariam de ser sonhos...

Há-se, pois, de na vida fazer-se poesia, porém não dela própria, eis que assim se dissecaria a capacidade de enxergar-se o belo; nem mesmo Narciso foi capaz de amar a si próprio e sobreviver... Digo-lhe que poesia é para ser sentida. A vida para ser da poesia fonte de inspiração, nunca anseio de imitação...

Há de se lamentar ou almejar, hoje e sempre, o que relatam as poesias, mas não se alcançar na vida dessegredo que a torne daquela arremedo, posto que quando a vida a imita, aquela de desgosto se irrita: tornar-se tão acessível, perde seu status de arte, da vida passa a tomar parte...

Assim faz o poeta, que tira da vida a inspiração. Pode até viver da poesia, mas não tenta vivenciá-la; sabe que só a consciência e discernimento possibilita a continuação da sua obra... Viver de poesia não é viver a poesia...

Viva, pois, a vida com intensidade, não tema as desventuras, os dissabores, e siga captando dela aquilo que te faz poeta, deixe que tuas poesias exprimam desejos, paixões e frustrações; tuas próprias ilusões, lembranças e saudades, mas não tentes transformá-las em realidades.


Mar de amor...

Música deste post (é bem melhor com música):"The Nearness of You" (1938), de Hoagy Carmichael, com letra de Ned Washington. Interpretação de Sweet Jazz Trio.



MAR DE AMOR

Quero ser da tua vida o mar...

Dar numa praia bravia a te amar,
onde as ondas se acapelam, se arrepiam
e sobre ti as espumas espirram,
assim como como se ele estivesse a te dar
gotículas de prazer a gozar

Quero ser da tua dor o mar...
Banhar tua alma atormentada e te acalmar
Fazer-te esquecer todos os dissabores
Salgar e esturricar ao sol teus desamores

Quero ser de tuas esperanças o mar,
Daquelas que na aflição pões-te a sonhar,
Onde o amor persista por toda tua existência
Posto que o mar é eterno, nele não há ausência.

Quero ser do teu corpo o mar,
na ressaca da paixão ainda beijar
milímetro por milímetro esse corpo teu
Ser, dessa Venus, o Netuno; dessa Terra, o Prometeu.

Quero ser o teu mar,
já que a ele você sabe amar.




Legado

Música deste post (é bem melhor com música): "Gigi", música de Frederick Loewe e Alan Jay Lerner, interpretação de Harry James (trompete/lider) e Orquestra.





Quem tem razão

Música deste post (é bem melhor com música): "The Entertainer", música de Scott Jopli, intérprete principal é o próprio Scott Joplin.
















Quem
tem
razão...



Quem tem razão é contabilidade.

Prefiro cultivar a vaidade

De ter mil amores,

Não curtir dissabores.

Ser um tipo de anarquista.

Só com isso se conquista:
— Mulher bela e formosa;

— Música boa e brejeira;

— Dos filhos o coração.


E se na vida há emoção

Que se diga maior do que esta,

Mereço um tiro na testa.

 .


Xexé, cachorro assanhado

Música deste post (é bem melhor com música): "Bem-te-vi Atrevido", música de Lina Pesce. Interpretação de Sivuca.



Bem feito! Foi mexer com o porco espinho, botar o focinho onde não devia...










Xexé,

Cachorro Assanhado




Sinto-me larvado, azoratado, um xexé que vê o mundo de forma estranha: estranho o casamento entre homens; estranho casamento entre mulheres; estranho filhos com  duas mães e nenhum pai; estranho filhos com dois pais e nenhuma mãe.

 
Estranho bundas e tetas, caralhos e bocetas, exibidos em bancas de revista como se fossem artistas de cinema e corre-me um arrepio de ter chegado ao tresvario.
 

Putarias e traições nas novelas em horário juvenil atestam-me que estou senil.

 
— Xexé! O que você está fazendo?

 
— Estou no computador... Num site pornográfico!



— Xexé !?!! Seu cachorro assanhado!

 
— Ué!... Sou Xexé, mas não sou mané.


Sem razão

Música deste post (é bem melhor com música): "Quando Me Lembro", música de Luperce Miranda, interpretação de Sivuca.











Sem razão
 

Não quero a razão!
Já a tive, nela cresci, passei minha juventude e maturidade.
Pela razão conheci a riqueza, vivi na nobreza, cai na pobreza.
Dela decorreram tantos sentimentos críticos...
Por ela abdiquei de tantos valores,
com ela procurei amores,
Só encontrei dissabores.

Não quero a razão.
Agora, na terceira idade,
Estou preparado para tê-la só como companheira eventual...
Uma “ficadinha” vez ou outra.
Destituo-me do senso crítico.
Abandono a concupiscência, o deísmo, a noética.  

Minha razão só valeu para mim.
Não me lembro de algo que tenha no mundo se alterado em decorrência da minha razão
e permanecido.
Nem o amor dos filhos ou das mulheres a paixão,
Que hoje é tudo o que me interessa.
E nem quero saber se tenho razão.
Não quero a razão.